Desde que a lei da guarda compartilhada entrou em vigor, ela é uma regra no caso da separação dos pais. A ideia é garantir, sobretudo, uma divisão equilibrada do tempo de convivência da criança com a mãe e com o pai. Mas será que é simples assim?
A VISÃO DA JUSTIÇA A advogada Alexandra Ullmann (RJ), especialista em direito de família e
questões relativas à alienação parental, esclarece as questões mais comuns.
O que significa a guarda
compartilhada?
Quer dizer que, após o divórcio,
tanto a mãe quanto o pai terão
responsabilidade de cuidar do
filho (até 18 anos): levar à escola,
decidir sobre o tipo de criação,
autorizar viagens...
Isso implica dizer que a
criança terá duas casas?
Não! Guarda compartilhada não é o
mesmo que convivência alternada.
A criança tem como referência
apenas um domicílio — o da mãe ou
o do pai. O foco está nas decisões
compartilhadas. Sobre a convivência,
ela deve ser dividida de forma que
facilite que o filho construa vínculos
com os pais igualmente.
A lei é obrigatória?
A partir de dezembro de 2014, a
aplicação da Lei 13.058 passou a valer
independentemente do acordo ou
desejo dos pais. A exceção à regra
se dá em duas situações: quando
um dos genitores declara que não deseja a guarda do filho e quando,
após avaliação multidisciplinar (com
psicólogos, psiquiatras, assistentes
sociais...), verifica-se que um dos dois
não tem condições de assegurar o
bem-estar do menor. Nesses casos, o
juiz pode definir a guarda unilateral.
Há avaliações periódicas para
saber se a guarda compartilhada
funciona bem para os filhos?
Isso só acontece quando não existe
consenso entre as partes e é decretada
uma demanda judicial. Após a
determinação da guarda, não cabe ao
Judiciário o acompanhamento familiar,
pois a regra é que pai e mãe tenham
direitos iguais de opinar nas tomadas
de decisão em relação ao filho.
E se a separação dos pais não
acontece de modo tranquilo?
O interesse dos filhos deve se
sobrepor ao dos pais. Portanto,
mesmo que o ex-casal tenha uma
relação conflituosa, o diálogo precisa
ser travado de forma civilizada para as questões relativas à criança. Senão os
desentendimentos acabam em longos
processos judiciais, nos quais as
crianças são sempre as prejudicadas.
Há pais que não ligam para os
filhos. Isso é levado em conta
para determinar a guarda?
A guarda compartilhada não se
relaciona simplesmente a convívio,
é um conjunto de deveres e
obrigações, ônus e bônus. A lei
determina que mesmo quando ela
é unilateral o outro genitor tem que
se responsabilizar pelos interesses
do filho. As questões que envolvem
menores são sempre resolvidas caso
a caso, as peculiaridades de cada
família são avaliadas por peritos
indicados pelos juízes.
Como se dá o pagamento de
pensão no caso da guarda
compartilhada?
A pensão alimentícia se refere ao
pagamento das despesas dos filhos.
Existem dois tipos: as exclusivas, que
deverão ser divididas igualmente entre
pai e mãe; e as residenciais, que são
partidas entre o número de moradores
da residência e, depois, a parte que
couber ao menor, rateada entre pai e
mãe. No entanto, se a convivência for
alternada ou houver uma divisão igual
do tempo de convívio, as despesas
residenciais ficam a cargo de cada um
dos genitores, quando o filho estiver
com cada um deles. A verba alimentar
deve sempre se basear no tripé
necessidade da criança, possibilidade
do genitor e proporcionalidade entre
os ganhos de pai e mãe.
Essa lei é válida somente para
quem se separou a partir da
sanção dela?
Nos casos antigos, em que já há
guarda unilateral deferida para
qualquer uma das partes, não é
necessário mudar nada. A não ser
que um dos pais tenha interesse
— aí deve solicitar a alteração à
Justiça. No entanto, a partir de agora,
a guarda compartilhada é lei e deverá
ser aplicada em todos os casos que
derem entrada no Judiciário.
E o emocional, como fica?
Para a psicóloga e psicoterapeuta Andreia Calçada* (RJ), a guarda
compartilhada é o melhor caminho para todos, pois promove o convívio entre
os pais após a separação, o que é muito saudável para a criança — saiba mais
De que modo os pais devem
proceder para que as mudanças
sejam tranquilas?
É importante que, após a separação, a
rotina do pequeno não sofra grandes
alterações. Qualquer mudança deve
ser previamente avaliada pelos pais.
Quanto maior a criança, mais
difícil é essa adequação?
Seja qual for a idade do filho, os pais
precisam sempre mantê-lo no foco das
decisões que o envolvem. Assim não
sofrerá com mudanças bruscas, que
favorecem o medo e a insegurança. O
respeito pelo filho, o cuidado com o
cotidiano dele e a boa convivência dos
pais com a criança são essenciais.
Por mais que um casal tenha
convivido junto, cada parte tem
o seu estilo. Isso gera confusão?
É natural que as diferenças na
educação de pai e mãe se reflitam na
forma de lidar com a criança — isso
independe de o casal estar separado.
Porém, por mais que os estilos de
vida sejam diferentes, os pais devem
manter limites. É preciso explicar para
a criança que, embora eles tenham
maneiras diferentes de agir, não
significa que um é melhor que o outro.
Como compartilhar a guarda
quando o casal chega ao divórcio
com ressentimento e discórdia?
O juiz precisa especificar claramente
a forma de convivência entre as
partes para que os conflitos sejam
diminuídos. Ele pode determinar, por
exemplo, que o pai encontre a criança
num lugar neutro, como a escola, e não
na casa da mãe, evitando confrontos.
O que fazer quando o filho
expressa a vontade de não
encontrar com um dos pais?
A primeira providência é avaliar o
motivo, tentando entender o que se
passa com diálogo e carinho. Nessa
conversa, o fi lho precisa saber que
sempre haverá o momento de estar
com um dos pais. A resistência da
criança deve ser compartilhada e
discutida com a parte em questão.
Como fica a criança quando
um dos ex-parceiros se envolve
em outro relacionamento?
A apresentação de um novo amor
deve ser gradual, e a criança tem que
ser muito respeitada nessa transição.
Diga que a relação dos pais acabou
como namorados, mas continua
sendo viável como pai e mãe.